domingo, 18 de março de 2018

AMOR NA ROÇA


Você jamais saberá o gosto
Do meu beijar
Pois antes do beijo, eu choro
E o beijar tem gosto de lágrimas
Que ásperas
Não servem para se afagar,
Sem afago meu beijo fica mudo,
Cego, atrofiado, e surdo
Órfão dos carinhos rudes do mundo.
Insensatez dos atos, atores
Que representam à alegria
Quando em penumbra se embriagam
Da tristeza negra e moribunda;
Nasce do segredo exposto
O androceu trágico da rosa
Que ao som fino da bossa
É o parto feliz do morto
Poeira no vento sulcado do rosto.
Do gosto farto do enfarto
Renasci do meu próprio mal
Enquanto renasço me mato
Cansei de um dia sempre igual
Onde se esquecem do beijo
E o leigo formou-se bacharel
Todo de negro, canudo de papel
Se esqueceu do analfabetismo
Do seu sentimento de egocentrismo
Misto de candura, loucura
Tomou-me pela mão, e aplicou
A mais injusta das severas surras
Enquanto me beijava e me tomava
Ralhava-me suas nuas juras
Com medo, caminhei em ruas
Que de tão escuras, embora minhas,
Jurava serem suas...

O gosto do meu beijo, que é lágrimas
Regara o meu pomar de rosas
Enquanto colhe-las terei cuidado
Para que a poesia
Não se transforme em mera prosa
E assim, o androceu trágico da rosa
Sepultou nosso amor. Na roça.


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