domingo, 25 de março de 2018

LÁ VAI O POETA...





Lá vai o poeta bêbado
Que se embriagou na própria nostalgia
Procura agora uma rua morta
Onde a lâmina cava rasga a aorta.

Lá vai o poeta louco
Que enlouqueceu de tanta sanidade
Querendo rimar rimas ricas
Onde antes não tinha nada
Agora, busca vãs palavras
Para criar sua filosofia desmiolada.

Lá vai o poeta pouco
Que de tão pouco, por pouco, não soçobrou
Esmiuçou-se a quase pó, tamanho
Foi o dó, que por fim , sozinho e só
Abundou de forma tal que até sobrou.

Lá vai o poeta doente
Que se enfermou de amor,
Até o ranger dos dentes
Mostrar o peito, furado, o coração
Tombado
Infarto de melancolia
Chora à lua à noite, cria de dia
Assim se cura, tonto de poesia.

Lá vai o poeta nômade
Que não tem casa, nem lar
Almoça poesia, janta Neruda
Esmiúça na lama fria, de cor de pia,
O solo firme onde finca
O adeus de todo o santo mísero um dia.

Lá vai o poeta flor
Que flori na prima Vera
E por ela recria uma nova tragédia
Romeu e Julieta vinte vezes ao dia.
Caminha numa procissão serena
Emudece, se sobre ele, as pálpebras dela desce
Suas varias cores criam novos aromas
E no fim, após vil soma despetala
O que escreve...


Lá vai o poeta pranto
Que se mina de água , se veste com manto
E se deságua em verso
Pelo avesso se encharca
Se afoga de mágoa e pó.
Desse pó molhado edifica
No edificar se consola
No consolo se consolida
No consolidar cria
E criando...

Lá vai o poeta canto
Que cantou ao vento que despiu seu manto
Tirou de si o peso de ser santo
De bom foi tanto
Que o pranto esqueceu, secou o choro
Abriu o riso até expor o siso
E nisso, disso, se fez canção
Até raiar as andorinhas e se fazer verão.

Lá vai o poeta gente
Que nasce, cresce, cria, chora, e sente
Por vezes transa, por vezes ama, às vezes mente
E no fim, por vezes morre... Ou alguém se esquece.

Lá vai o poeta mudo
Que nada diz.

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